quarta-feira, 29 de julho de 2009

Flávio Gikovate fala do sentimento por trás das palavras

Definições do amor
Pensamos por meio de palavras e frases. Em nosso processo de reflexão elas desempenham um papel semelhante ao dos números na matemática. Qualquer erro no uso das palavras determina um engano que, na seqüência dos pensamentos, tenderá a se amplificar e nos conduzirá a conclusões cada vez mais equivocadas.
Não se trata de insistir para que sejamos mais atentos ao significado das palavras que utilizamos apenas por purismo ou por um anseio perfeccionista. Trata-se de não utilizarmos mal nossa mente, já que ela funciona a partir das palavras, frases e suas conclusões que delas extraímos. Qualquer erro poderá ter conseqüências desastrosas para nosso futuro. O mais grave é que teremos cada vez mais dificuldade para detectar onde ele está, já que ele costuma se perder na cadeia das nossas reflexões.
A forma mais comum de engano no nosso sistema de pensamento deriva de usarmos uma mesma palavra com mais de um sentido. No caso em questão, a palavra é AMOR. Na linguagem coloquial, amor é usado como sinônimo de solidariedade, como amor por tudo e por todos aqueles que estão sobre a Terra.
"Eu te amo" é uma expressão usada por um sedutor que conheceu sua "vítima" há poucos minutos e deseja levá-la para a cama. Pessoas alegres e pouco criteriosas se dizem encantadas e amam com facilidade cada nova pessoa que conhecem. Uma pessoa egoísta empenhada em se mostrar feliz consigo mesma não titubeia em afirmar: "eu me amo". Estamos diante de diferentes usos da mesma palavra: uso equivocado, vazio, idealizado ou maroto. Usamos a palavra amor como o coringa em certos jogos: ela serve para todos os momentos e para todas as situações.

Amor é palavra usada e abusada.


É dita por quem tem alguma idéia acerca do seu significado e também por aqueles que a repetem apenas por imitação. Usa-se mais a palavra amor do que vive-se o sentimento. E quantas são as pessoas que se sentem felizes no amor? Pouquíssimas. E quem é capaz de definir o que seja o amor? Quase ninguém. E como podemos pretender nos dar bem nesse campo se não sabemos nem mesmo como conceituar o sentimento?
Peço licença para propor uma definição de amor. Sugiro que acompanhem com atenção a seqüência do pensamento para que possamos iniciar a desenrolar esse intrincado novelo de lã. A questão é fundamental, pois envolve emoções que nos são fundamentais e em torno das quais temos sofrido muito. Envolve também um exercício de reflexão, uma introdução à arte de pensar com rigor e precisão, condição importantíssima a ser respeitada quando pretendemos nos aprofundar em qualquer setor da nossa subjetividade - ao menos por aqueles que pretendam desenvolver uma vida íntima rica, gratificante e criativa.

*Flávio Gikovate é médico e psiquiatra, colaborador de diversoso jornais e revistas e autor de Falando de Amor e O amor nos anos 80.

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